quinta-feira, 17 de junho de 2010

Inocência (ou nem tanto...)

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No declive sereno rebolam os olhos pelos campos de ervas e flores encosta abaixo como quem se desliga e se minimiza ao ponto de vista de uma pétala. Deixa-se de se ser activo. Desliga-se o cordão umbilical e o telemóvel e transporta-se o presépio à inanimada experiência…

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Onde só as folhas falam, os pássaros voam e os rios cantam, no intervalo de cada milímetro e de cada segundo encontro-te tranquilamente vigilante. Lá, atrás do declive onde o tempo perdeu o relógio. Também tu paraste.

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Curioso… nascem ao mesmo tempo, filhos da mesma mãe – a discórdia...

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Vão nascendo… Partos difíceis onde a mãe, melodramaticamente, acaba sempre morta, e nós, os recém-renascidos, sofremos sempre deste amnésia retrógrada… Que conveniente!

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Ah!! Mas quando o tempo pára… quando o tempo deixa de ter sentido e os segundos se sentem latejantes na nuca, segundo a segundo, a fazer eco até passar um minuto… quando isso acontece… afogamo-nos numa enxurrada de imagens sequenciais, tristes por sinal, do que foi um parto – o nosso.

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Isto de renascer da memória faz-nos mais velhos.

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Mas note-se a beleza disto tudo, não é de todo o parto! Não, não! A beleza disto tudo é nascer de olhos fechados, de novo.

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Ensurdece-me o despertador e sussurro-te: "Bom dia de manhã!"...

terça-feira, 8 de junho de 2010

Psshhttt

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Apetece-me ser átomo
para te morder por dentro...
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segunda-feira, 7 de junho de 2010

Quero muito que sejas feio e cego.

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Quero muito que sejas corcunda, de verruga e de uma horribilidade monstruosa para que te possa amar só por aquilo que os meus olhos não vêm. Aliás, só assim te poderia amar, com todas as letras. Sendo tu o Feio.

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Eu quero ser linda como as Ninfas do Poeta, perfeita como as cornucópias celestes e magnifica como as constelações para que te prove que te amo, como inimaginavelmente seria alguma vez possível.

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Quero que sejas cego, para que não te ofusques com o brilho amarelo basso do corpo um dia morto.

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Quero que me mates, por favor. Quero sim, o apogeu da Loucura sentido nos teus olhos.

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Quero que me desfaças e me comas, canibal orgástico ritual, quando formos muito velhinhos.

Vou até escrever um testamento! Vou exigir que me comas. Cozinha-me. Corta-me às fatias Gourmet e marina-me; tempera-me com as tuas lágrimas salgadas e espreme-te. Inala-me os vapores e fuma-me com papel de arroz. Espeta-me um garfo de prata e às fatias finíssimas Nobres, corta-me delicadamente as coxas.

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Serve-me com um amo-te e morre comigo.

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